14 de abr. de 2010

[Textos] Sobre o texto sobre o processo de bolonha


Escrito por LCT/BÉLGICA    Qua, 24 de Fevereiro de 2010 23:30 No horizonte do reinício do ano acadêmico de setembro de 2010, a fusão das universidades católicas na Comunidade Francesa da Bélgica será efetiva. A atual Universidade Católica de Lovaina (UCL), as Faculdades Universitárias Notre Dame da la Paix (FUNDP), as Faculdades Universitárias Saint- Louis (FUSL) e as Faculdades Universitárias Católicas de Mons (FUCAM) desaparecerão em favor da "UCLouvain". Quais são as causas e os objetivos deste processo? Que futuro traz isso para nós estudantes e trabalhadores das universidades, nos próximos anos?


Esta fusão é uma etapa complementar no aprofundamento do processo de Bolonha na Bélgica. Organizada em escala mundial [1] - pela OMC e a UNESCO - e européia - pelo conjunto dos governos que participam do Conselho Europeu - esta reforma tem por objetivo liberar o setor do ensino superior, criando as condições para a instauração de um mercado de ensino e pesquisa. Isso passa pela instauração dos ciclos "bacharelado- mestrado- doutorado" (3-5-8) e de documentos comprobatórios de cursos no conjunto das universidades européias pelo sistema ECTS (European Credit Transfer System). Assim os diplomas se tornam equiparáveis, como produtos em um mercado. Este processo implica no reconhecimento de uma quantidade crescente de formações do setor privado e a profissionalizaçã o dos diplomas, paralelo à dependência do ensino e da pesquisa aos investimentos privados.

Por que as universidades se fusionam na Europa?

No marco da instauração de um "livre-mercado" capitalista, as universidades reagem como empresas em competição. A fusão denuncia a necessidade das universidades, de ganhar uma posição dominante ante seus novos competidores. Mas sabemos que é uma conquista sem fim: há muitos convocados, mas poucos cargos! Como consequência, em termos de França, prevê-se que somente uma pequena dezena de "pólos de excelência" surgirá dos processos de fusão, contra 84 universidades hoje. As faculdades que não chegarem a atrair suficiente financiamento privado se verão cada vez mais com financiamento insuficiente, dotadas de uma infra-estrutura deteriorada, e desvalorizadas em relação a estes "pólos de excelência", com mensalidades exorbitantes, elitistas e "rentáveis", à imagem do atual mercado da educação anglo-saxão.

Como isso será operado?

Com a finalidade de ganhar esta posição dominante no mercado, a tarefa dos Conselhos de Administração (onde ocupam cadeira majoritária a equipe de reitores e os "membros externos") consiste em otimizar o poder de atração e a competitividade das empresas universitárias. Para os estudantes e os professores, isso consiste em ver a educação passar de um papel de serviço público ao de uma empresa em busca de lucro.

Poder de atração em primeiro lugar. Esta "excelência" acadêmica é buscada com a finalidade de atrair "a elite européia quanto ao ensino e a pesquisa", pessoas que por suas contribuições financeiras e suas publicações farão subir a nota da universidade nas classificações internacionais (rankings), tornando-se assim atraentes para o investimento das empresas privadas. Os capitalistas precisam, especialmente em período de crise econômica, de setores onde investir, onde fazer frutificar seu dinheiro. Querem assim que o ensino possa ser um lugar de investimento como outro qualquer. Graças a isso, têm também a oportunidade de formar e recrutar diretamente seus futuros quadros (por exemplo, a cátedra PriceWaterhouseCoop er em direito fiscal na UCL, uma empresa que defende os presentes à patronal por "interesses nacionais").

Para o conjunto dos estudantes, isso vem acompanhado do aumento do custo do ensino, da comercializaçã o dos programas de curso ou inclusive sua amputação ou sua supressão. Trata-se também de aumentar a organização da divisão social do trabalho entre os estudantes titulares de bacharelados que são preparados para uma profissão, para os quais a direção confiará tarefas subalternas na produção, e os estudantes titulares de curso de pós-graduação, raros e caros, os futuros quadros. A empresa-universidad e, por sua vez, financeiramente autônoma e submetida à concorrência em escala européa [2], não chega a garantir sua competitividade mediante unicamente o financiamento público por estudante, que por outro lado está baixando constantemente. Para ser "competitiva" , não pode, portanto, prescindir de financiamento privado.

Falando de competitividade, trata-se de aumentar o número de clientes, a "quota de mercado" da empresa. Neste caso, os estudantes das FUNDP, FUSL e FUCAM permanecerão na UCL e não irão "para a concorrência" (ULg, ULB). Trata-se também de aumentar o ritmo de trabalho dos pesquisadores (avaliando- os, sancionando- os e diminuindo a duração de seu contrato) e de pôr suas publicações em comum na nova universidade fusionada com o fim de subir nas classificações e sentar assim sua imagem de marketing como empresa líder.

A este respeito, constatamos que as primeiras iniciativas postas em prática pela Coordenação Projeto Lovaina (CPL) são as de "imagem-marketing" , "ensino" (que inclui as estratégias de contratação e a campanha de comunicação com destino aos estudantes secundaristas) e "relações internacionais" .

As conseqüências em longo prazo deste processo?

Para enfrentar a concorrência no mercado da formação, as universidades recorrem a um método muito conhecido na economia capitalista: a concentração de capital por fusão ou aquisição. Esta última opção foi utilizada, por exemplo, na compra do Departamento de Meio Ambiente da Universidade da Califórnia de Berkeley pela British Petroleum. Na Bélgica, assiste-se em primeiro lugar a um fenômeno de fusão. Estes dois processos são sempre acompanhados de uma "reestruturaçã o". Em primeiro lugar a direção impõe uma "racionalizaçã o" da oferta de formação a raiz das exigências de "rentabilidade" , que abre as portas para uma supressão de cursos (hoje principalmente em ciências humanas), de ciclos (por exemplo, os cursos de estudos clássicos e sociologia nas FUNDP, em 2004) e de faculdades (por exemplo, o Instituto de Ciências Filosóficas da UCL, onde o ensino estava vinculado à faculdade de Artes e Letras em 2009 enquanto a pesquisa seguia sendo autônoma). Estes ataques contemplam em primeiro lugar as formações julgadas incompatíveis com as "oportunidades do mercado" pelos investidores públicos ou privados: as ciências humanas e sociais, a pesquisa básica não diretamente "valorizável" , etc. Esta "racionalizaçã o" conduzirá, em paralelo, a uma especialização de cada área, vinculada às solicitações da patronal local [3]. O objetivo é realmente de permitir "economias em escala graças a uma otimização dos meios".

Do mesmo modo, prevê-se uma supressão de postos na estrutura administrativa, já sobrecarregada em cada área, bem como no pessoal de ensino e de pesquisa. Por outro lado, a prioridade dada à pesquisa conduz inevitavelmente a uma redução do financiamento e dos postos atribuídos aos cursos. Concretamente, o acompanhamento dos cursos do primeiro ciclo, já insuficiente, vai piorar ainda mais. Em geral a oferta de cursos tende a uma concentração em diferentes programas e à diluição dos mesmos: atualmente são oferecidos 12 cursos por ano ao invés de 16, sem aumento do acompanhamento. Como dizem agora abertamente alguns professores: "o ensino é a gata borralheira da divisão de ensino/pesquisa" .

Por último, inevitavelmente, este processo combina-se com uma perda de autonomia das áreas e uma concentração do poder nas mãos da burocracia central do Conselho de Administração da universidade fusionada, que se aproveita da fusão para abrir-se amplamente à participação de "membros externos", os quais por sua vez também se esmeram em cuidar da defesa dos interesses particulares dos benfeitores privados [4].

Unifiquemos as lutas

Frente a isso, não temos outra alternativa que a de nos unir, estudantes e trabalhadores universitários, em uma luta comum para exigir do Governo o orçamento adequado com o fim de garantir a universidade pública e gratuita, contra todo financiamento e controle privado, bem como a retirada imediata da reforma de Bolonha que constitui um ensino em duas velocidades. Para isso devemos lutar em primeiro lugar por nossa liberdade de organização e por uma democracia real, tanto em nossos órgãos de Conselho como em nossos sindicatos.

Por último, o movimento dos estudantes e trabalhadores universitários não poderá obter vitórias duradouras se não se unificar com as lutas em curso contra os mesmos interesses que atualmente destroem a universidade pública: a destruição de todos os demais serviços públicos - correios, ferrovias, saúde... - e os ataques patronais às medidas de amparo devido à crise.

- Por uma universidade gratuita, laica, pública e popular!
- Retirada imediata do processo de Bolonha e de todos os planos de destruição dos serviços públicos!
- Organizemos nossa luta pela democracia básica e a independência de classe!
- Estudantes e trabalhadores, a luta é uma só!

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