25 de abr. de 2007

[Textos] Escola das Américas

ESCOLA DAS AMÉRICAS

Foi então ... Era quatro da tarde, e aquilo não podia estar acontecendo! Como em Bagdá, como em Faluja, como em Ramalah, como em Mogadíscio, como no Saara Espanhol – de repente estavam ali os canhões e os tanques e as tropas, e aquilo parecia reportagem que se via na Al-Jazeera durante a Guerra do Líbano, e os canhões e os tanques a tudo cercaram e interromperam o acesso à água, bloquearam as estradas e ninguém mais entrava e nem saía, e um tanque derrubou uma barraca que tinha dentro mulher grávida e criança, e o terrorismo implantado foi coisa que nem merece ser descrito neste texto que falava na beleza dos sonhos, da resistência e da Esperança! Em pouco, pouquíssimo tempo, os recém-chegados deram aos experientes e aos inexperientes um curso completo do que é, realmente, o Exército, aquele que a gente se acostumou a considerar "Braço forte, mão amiga" e da confiança que se pode ter nas autoridades. O final da tarde e a noite foi coisa para nunca se esquecer, e o que eu fico pensando é que muitos, decerto a maioria daqueles soldados que ali estavam também eram filhos de gente pobre e humilhada, e que talvez fizessem o seu papel de monstros lembrando vagamente onde estariam seus pais, suas irmãs, seus filhos... Mas o Monstro lhes mandava aterrorizar e eles aterrorizavam, e bem que tenho ouvido falar que continua bem em atividade a Escola das Américas![2] Pode-se resumir o acontecido numa frase: a total ausência de qualquer respeito à dignidade humana naqueles campos. Ordens em altas vozes, no alto falante dos soldados, dizia coisas como "A ordem tem que ser cumprida!" "Vamos atacar, vamos desocupar a área!" "Vamos cumprir a ordem!", intermediadas por hinos patrióticos, e de discursos de intimidação, que falavam muito como "a noite vai ser dolorosa, a noite vai ser longa!". Há que se pensar que tais coisas aconteciam dentro de total escuridão, mas que antes que a noite caísse, postara-se ali, além dos caminhões e outros veículos, os enormes três tanques e uma dolorosa e macabra fileira de ambulâncias.
Foram horas e horas, toda uma noite de terror, principalmente para as crianças, e não fosse a gente pobre tão unida e tão capaz de juntar suas parcas forças para resistir, e talvez o estrago fosse pior. No meio do terror, do barulho, da fumaça que cegava a todos dentro do acampamento, das técnicas de aterrorizamento nos alto falantes e pelos próprios canhões, tanques e ambulâncias, a gente pobre se uniu e negociou o quanto pode – o inimigo era mais forte, havia que capitular. E o sonho daquela terra acabou. Não sei se ficaram lá as 1.900 sementes de repolho daquele horticultor, quando os agricultores tiveram, mais uma vez, que abandonar aquela terra mais de uma vez encharcada de sangue, como o vinham fazendo desde os tempos de Percival Farquhar.
Fico aqui me perguntando uma pergunta sem resposta: quem deu a ordem para aquele terrorismo de guerra sobre a população indefesa? Temos no poder um homem que acreditamos ser representante do povo. Teria partido dele a autorização para aquilo? Quem autorizou? É bem verdade que no fim ninguém morreu de bala e de granada – mas, e a morte lenta pelo abandono, pela pobreza, pela falta de perspectiva? Onde estão os direitos do ser humano?
E O QUE É QUE AQUELA SOJA ESTAVA FAZENDO LÁ? Que as autoridades competentes me expliquem!

Blumenau, 16 de abril de 2007.


Urda Alice Klueger
Escritora

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